Arroz: conheça as peculiaridades dessa cultura

A espécie Oryza sativa L. é uma gramínea, originária da Ásia, continente que até hoje se destaca na produção do cereal. O arroz compõe a base alimentar do planeta, sendo fundamental para a nutrição diária de mais de 3 bilhões de pessoas, além de servir como matéria-prima para a produção de bebidas alcoólicas, como o saquê.

O Brasil é considerado o 9º maior produtor de arroz do mundo, totalizando 9,9 milhões de toneladas do cereal na safra 2022/23, sendo grande parte da produção oriunda de solos gaúchos.

Os sistemas produtivos de arroz possuem peculiaridades que os tornam ainda mais complexos. Suas características morfológicas permitem o cultivo em áreas alagadas, sendo o sistema produtivo predominante no Brasil, além do arroz de sequeiro, também conhecido como “arroz de terras altas”.

Índice

Sistemas produtivos do arroz

As adaptações morfológicas do arroz, como a presença de aerênquimas, e fisiológicas permitem à cultura a adequação e desenvolvimento em condições diversas, até mesmo em anaerobiose (sem necessidade de oxigênio para crescer). 

Os principais sistemas de cultivo são em sequeiro e irrigado; entretanto, o segundo pode apresentar particularidades em relação à irrigação usual presente nas outras culturas, trazendo à tona fatores que exigem manejos diversos de adubação, controle de pragas, doenças e plantas daninhas.

A produção de arroz em sequeiro, ou arroz de “terras altas”, é realizada – principalmente – em áreas com regimes climáticos favoráveis ao desenvolvimento da cultura, como nos estados de Mato Grosso do Sul, Maranhão, Minas Gerais e São Paulo. Dessa forma, o período de estabelecimento da cultura deve ser no verão, entre outubro e abril, período de maior pluviosidade e simultâneo ao ciclo da soja, carro-chefe do agronegócio brasileiro. 

Apesar de ser estabelecido em condições climáticas favoráveis ao desenvolvimento, a instabilidade do regime pluviométrico desfavorece o desempenho do cultivo em comparação ao sistema irrigado, resultando em produtividades mais baixas quando comparadas às obtidas em arroz irrigado (em média 4,5 t ha-1).

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Figura 1 – Cultivo de arroz em sequeiro.
Disponível em: https://blog.aegro.com.br/plantio-de-arroz/.

O sistema de “terras altas” pode, também, contar com irrigação suplementar. Na Figura 2, pode-se observar um sistema com irrigação por aspersão com auxílio de pivô central, mas a cultura continua dependente das precipitações para seu desenvolvimento pleno.

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Figura 2 – Cultivo de arroz em sistema de “terras altas” com irrigação por aspersão.
Fonte: Araújo, s.d.

Cerca de 75% do arroz produzido no Brasil é cultivado em ecossistemas de várzeas, ou seja, sob sistema irrigado/inundado. Tal característica da produção brasileira permite a estabilidade do comércio do cereal no país, uma vez que a irrigação reduz o impacto do possível déficit hídrico causado pelos fenômenos atmosféricos.

Segundo a Embrapa, a região Sul do país produziu mais de um milhão de hectares irrigados de arroz por ano nas últimas safras, contribuindo com o aumento do estoque nacional de arroz e beneficiando as relações internas e externas de mercado, fornecendo cerca de 12 milhões de toneladas. A produtividade média em sistemas irrigados é mais alta que em sequeiro devido à disponibilidade hídrica e, consequentemente, maior absorção de água e nutrientes pelas plantas, atingindo – em média 7 t ha-1.

O sistema de inundação é o mais utilizado nos cultivos de arroz irrigado, onde se forma uma lâmina estática de água sobre o solo, alagando-o. Mesmo que sob anaerobiose, as plantas são capazes de se desenvolver plenamente graças aos aerênquimas, estruturas que permitem a circulação do ar pelo caule, conectando os estômatos às raízes.

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Figura 3 – Aerênquimas.
Disponível em: https://www.imago-images.de/fotos-bilder/aerenchym.
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Figura 4 – Sistema de arroz inundado.
Disponível em: https://www.revistarural.com.br/2020/05/24/novas-variedades-aumentam-producao-de-arroz-irrigado-em-to/.

Interpéries do sistema irrigado no arroz

Por mais que o sistema inundado permita a melhoria das condições de desenvolvimento do arroz, tendo em vista o suprimento da necessidade hídrica da cultura, a presença da lâmina d’água gera implicações em relação a outros fatores da produção agrícola, como fertilidade do solo, pragas e doenças.

A correção do solo em cultivos irrigados, por exemplo, tem a peculiaridade denominada “autocalagem”. Trata-se do processo de correção da acidez do solo pela ação dos microrganismos do solo, que – muitas vezes – pode dispensar a aplicação de calcário, apesar de não fornecer cálcio (Ca) e magnésio (Mg). 

Além disso, outro fator relevante é a escolha das fontes nitrogenadas utilizadas para a adubação do arroz inundado, tendo em vista a perda – via volatilização – das fontes nítricas, como o nitrato de amônio. Dessa forma, é fundamental que sejam utilizadas fontes amoniacais (como sulfato de amônio) e amídicas (ureia), visando maior eficiência da adubação e melhor uso dos recursos agrícolas.

A supressão da disponibilidade de oxigênio no solo pela inundação do sistema produtivo é impactante, também, no processo de redução do ferro (Fe) presente no solo. Tal processo consiste na redução do Fe3+ em Fe2+, sendo a segunda forma absorvida pelas plantas; assim, o aumento da disponibilidade de Fe2+ pode causar acúmulos excessivos do nutriente nas raízes e, consequentemente, gerar sintomas de redução da absorção de outros nutrientes.

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Figura 4 – Sintomas de toxidez por ferro.
Fonte: Nand K. Fageria.

Algumas pragas podem ser favorecidas pelo cultivo inundado, como o gorgulho-aquático (Oryzophagus oryzae), que ataca e causa prejuízos em grande parte da estrutura vegetal. A larva da espécie, conhecida como “bicheira-da-raiz”, ataca as raízes das plantas e pode causar prejuízos enormes para a produção orizícola, sofrendo influência da época de plantio (maior infestação no plantio em épocas chuvosas).

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Figura 5 – Adulto de Oryzophagus oryzae.
Disponível em: https://www.agrolink.com.br/problemas/bicheira-da-raiz-do-arroz_370.html.

A principal doença do arroz irrigado é a brusone, recorrente em todo o território brasileiro, e com ciclo rápido de disseminação. Dessa forma, a doença adquire maior importância tendo em vista a dificuldade de se contornar os efeitos negativos causados pelo fungo Pyricularia oryzae, que infecta diversas gramíneas além do arroz. Tal doença pode ocorrer em grande parte da planta, desde as folhas até as sementes. 

A brusone, na folha, gera pontos de coloração castanha rodeados por halos amarelos, evoluindo para lesões maiores e que podem gerar a morte dos tecidos em cultivares suscetíveis à doença. Quando atinge a panícula, a doença pode inviabilizar o desenvolvimento das sementes e, dessa forma, reduzir drasticamente a produtividade de grãos da cultura.

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Figura 6 – Sintomas de brusone na panícula.
Fonte: Cley D. M. Nunes.

Manejo de preservação da cultura do arroz

Tendo em vista as problemáticas apresentadas no tópico anterior, é fundamental que o orizicultor tenha em mente as possibilidades de manejo para mitigar os efeitos negativos dos fatores de produtividade.

O manejo para controle do gorgulho-aquático (Oryzophagus oryzae) pode ser dado por meio do manejo sanitário dos canais de irrigação, que transportam a água até a área produtiva, bem como o nivelamento do solo, evitando a agregação da praga em locais específicos da lavoura. o controle químico pode auxiliar no controle, mas não garante a sanidade da lavoura, tendo em vista a alocação das larvas nas raízes das plantas, bem como à barreira física imposta pela lâmina d’água. Dessa forma, o controle biológico pelo agente Beauveria bassiana vem ganhando força no manejo da cultura, mostrando potencial no controle dos agentes maléficos, reduzindo os danos ambientais causados pela aplicação de moléculas sintéticas utilizadas no sistema produtivo.

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Quanto ao manejo da brusone (Pyricularia oryzae), pode-se afirmar que o primeiro passo se dá na escolha da cultivar, buscando materiais genéticos que sejam menos suscetíveis à infecção pelo patógeno; além disso, é fundamental que haja rotação de cultivares, reduzindo a pressão de seleção da doença, o que gera benefícios à longo prazo para o sistema produtivo. O controle de plantas daninhas hospedeiras do agente patogênico, bem como o manejo correto de construção das áreas produtivas, é fundamental para a sanidade das plantas de arroz, propiciando altas produtividades. Por fim, é válido ressaltar que o controle biológico de Pyricularia oryzae, mesmo que não difundido, apresenta boa resposta à aplicação de Bacillus subtilis, que produz metabólitos inibidores do desenvolvimento do patógeno em questão.

Conclusões

O desenvolvimento da cultura do arroz é fundamental para a nutrição mundial, uma vez que o cereal compõe a base nutricional mundial, permitindo maior segurança alimentar por meio de um mercado crescente e internacional. Como em qualquer sistema de produção agrícola, a orizicultura exige cuidados e manejos aprimorados, principalmente em solos inundados, tendo em vista os fatores que inferem na produtividade e podem inviabilizar o desenvolvimento do cultivo.

Assim, pode-se tomar como prática essencial o manejo assertivo de pragas, doenças e adubação, visando o aumento da sanidade e produtividade da lavoura, buscando mitigar os efeitos negativos da inundação em relação à produção, como as perdas de N por volatilização, pressão de pragas e doenças específicas do sistema.

Referências bibliográficas

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NUNES, Cley Donizeti Martins. Cultivo do arroz: manejo de doenças. Manejo de doenças. 2021. Disponível em: https://www.embrapa.br/agencia-de-informacao-tecnologica/cultivos/arroz/producao/sistema-de-cultivo/arroz-irrigado-na-regiao-subtropical/manejo-de-pragas/manejo-de-doencas. Acesso em: 10 out. 2023.

SCIVITTARO, Walkyria Bueno. Cultivo do arroz: correção do solo e adubação. Correção do solo e adubação. 2021. Disponível em: https://www.embrapa.br/agencia-de-informacao-tecnologica/cultivos/arroz/producao/sistema-de-cultivo/arroz-irrigado-na-regiao-subtropical/correcao-do-solo-e-adubacao. Acesso em: 10 out. 2023.

TOMASONI, Carolina Maria et al. Controle biológico do gorgulho aquático Oryzophagus oryzae utilizando armadilhas luminosas com Beauveria bassiana em lavouras de arroz irrigado. Vértices, Campos dos Goytacazes, v. 20, n. 2, p. 180-184, ago. 2018.

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