Biofortificação de alimentos: o novo jeito de enxergar a agricultura

Há décadas, no mundo todo, são adicionados nutrientes suplementares a alimentos; no Brasil, por exemplo, o sal é suplementado com iodo e a farinha com ferro e ácido fólico. A fortificação desses alimentos é resultado de medidas públicas que procuravam sanar doenças muito comuns na população décadas atrás, como o bócio endêmico e a anemia. Ao entregar os nutrientes cuja carência conduzia a essas doenças em alimentos básicos de consumo geral, que antes estavam restritos a alimentos mais caros (como iodo em pescados e ferro em proteína animal), a ingestão pela ampla população adequou-se ao níveis mínimos sugeridos pelas instituições de saúde e esses problemas são raramente encontrados hoje. Mas isso é fortificação, e não biofortificação.

A biofortificação, segundo a definição da ONU, é “o processo pelo qual a densidade de nutrientes em plantas cultivadas é aumentada por meio de melhoramento vegetal, e/ou práticas agronômicas melhoradas e/ou biotecnologia moderna sem sacrificar qualquer característica preferida pelos consumidores ou, tão importante, pelos produtores”. Ou seja, diferente da adição industrial da fortificação, a planta acumulará esses nutrientes durante seu próprio crescimento. Isso significa que os alimentos produzidos sob a intenção de biofortificação serão mais ricos em nutrientes específicos, como zinco (Zn), selênio (Se), ferro (Fe), iodo (I) e enxofre (S). Mas por que, especificamente, esses nutrientes?

No organismo humano, o zinco desempenha um papel fundamental na estrutura e na função de enzimas responsáveis pela homeostase (processo de equilíbrio das composições químicas do corpo), e sua deficiência pode conduzir ao comprometimento físico e intelectual. O selênio possui propriedades antioxidantes e auxilia no bom funcionamento do sistema imunológico; sua falta está associada a problemas cardiovasculares e ao aparecimento de certos tipos de câncer. O ferro é constituinte da hemoglobina e atua na síntese de novas hemácias do sangue. O enxofre auxilia no transporte de nutrientes no organismo, e sua carência pode comprometer o sistema nervoso. O iodo é peça chave no bom funcionamento da glândula tireóide e sua falta, como citado anteriormente, pode conduzir ao aparecimento de bócio endêmico e outras doenças associadas aos hormônios produzidos por essa glândula.

Índice

Como é feita a biofortificação agronômica?

Vários pesquisadores procuram formas de enriquecer esses nutrientes na planta. Atualmente, os processos mais estudados e utilizados utilizam-se de vantagens genéticas e melhores práticas de manejo de adubação.

No campo genético é usado tanto o melhoramento genético clássico quanto a edição gênica. Em entrevista à revista Ciência em prosa, o professor Luiz Roberto Guimarães, do Departamento de Ciência do Solo da UFLA, disse: “Entre as diversas plantas, descobrimos e selecionamos quais delas possuem maior teor de nutrientes e aquelas com capacidade de acumulá-los”. O professor atualmente coordena, junto a Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (EPAMIG), uma rede internacional de pesquisas sobre a biofortificação de alimentos conhecida como Harvest Zinc, que conta com a colaboração de cientistas de 13 países.

Quanto ao manejo de adubação, visa-se adicionar via planta e/ou solo os nutrientes que se deseja a acumulação pelas plantas. É necessária atenção, entretanto, para a aplicação desses micronutrientes: da mesma forma que a falta de um nutriente é um problema, o excesso dele que conduz à toxicidade também é.

O casamento entre as variedades acumuladoras e as práticas de manejo é a chave para o extrair o máximo potencial de bioacumulação de nutrientes das plantas.

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Oportunidade de negócios da biofortificação

A biofortificação é pertencente ao que chamamos hoje de Agricultura Funcional, que foca na produção de alimentos que fornecem benefícios adicionais à saúde humana e animal além de suas propriedades nutricionais básicas. Além de ser a forma mais barata e eficiente de combater doenças e a má nutrição da população, esse setor se abre para um nicho de mercado promissor. Grandes mercados como China e Índia, que comportam em seus países mais de um terço da população mundial, já decretaram que sua prioridade é importar alimentos enriquecidos para suprir sua demanda interna. 

A China já é a maior compradora de soja com alto valor de proteína do Brasil, desbancando o mercado dos Estados Unidos. Se o Brasil falhar em suprir essa demanda, isso pode resultar em redução nas vendas do produto líder do agronegócio nacional nos próximos anos.

Conclusão

Dessa forma, a biofortificação de alimentos é uma grande oportunidade para o Brasil entregar um produto com um valor agregado maior, tanto para gigantes compradores externos como Índia e China, que compram 50% de toda a nossa produção, quanto ao mercado interno. O atraso em implementar essa tecnologia pode implicar na perda de competitividade do produto brasileiro frente aos mercados concorrentes, ameaçando grandes prejuízos ao setor mais importante da economia nacional.

Referências bibliográficas

MASCARENHAS, Karina; DIAS, Pollyana. “Superalimentos” enriquecidos com Iodo, Zinco e Selênio. Ciência em Prosa: Biofortificação de alimentos é alternativa no combate à fome oculta, Lavras, v. 2, n. 1, p. 30-39, dez. 2018. Disponível em: https://issuu.com/dcom-ufla/docs/revista_cp_2_issuu. Acesso em: 5 jan. 2024.

TALSMA, Elise F.; PACHÓN, Helena. Biofortification of crops with minerals and vitamins. 2017. Disponível em: https://www.who.int/tools/elena/bbc/biofortification#:~:text=Biofortification%20is%20the%20process%20by,importantly%20to%20farmers%20(1).. Acesso em: 5 jan. 2024.

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