O uso de produtos com a finalidade de aumentar a produtividade das culturas agrícolas tem se intensificado nos últimos anos. Dentre esses produtos estão os bioestimulantes, constituídos por uma série de insumos como extratos de algas, hormônios sintéticos ou subprodutos de fermentação, que em sua grande maioria contém aminoácidos em sua formulação (Colla et al., 2014; Shalaby; El-Ramady, 2014). O uso desses bioestimulantes tem se mostrado promissor, tanto no tratamento de sementes quanto na aplicação foliar (Khan et al., 2009; Crainge, 2011, Soares, 2014).
Os aminoácidos são moléculas orgânicas que contêm nitrogênio, carbono, hidrogênio e oxigênio, além de um radical livre ligado a esta estrutura, responsável pela sua caracterização, diferenciando os aminoácidos entre si (Buchanan et al., 2000). As plantas sintetizam muitos aminoácidos em seu metabolismo, mas os principais são o glutamato, glutamina e aspartato. Dentre estes, destaca-se o glutamato pelo fato de ser o primeiro aminoácido onde o nitrogênio absorvido pelas plantas é incorporado e, a partir dele, é possível obter uma vasta gama de outros aminoácidos pela ação das aminotransferases (Buchanan et al., 2000; Taiz; Zeiger, 2013).
Os aminoácidos podem desempenhar diferentes funções nas plantas, e estudos têm mostrado como a aplicação desses elementos pode causar uma melhora no desenvolvimento geral da planta, conduzindo a uma melhor produtividade.
Neste texto buscaremos expor os efeitos da aplicação de alguns aminoácidos em culturas agrícolas, bem como indicar como a aplicação desse bioinsumo é recomendada segundo os estudos consultados.
Índice
Como as plantas absorvem os aminoácidos?
Aminoácidos podem ser encontrados no solo em três formas: dissolvidos na solução do solo (chamados aminoácidos livres, disponíveis à absorção pelas plantas), ligados à fração mineral e/ou à matéria orgânica e na forma de proteínas. Sua absorção pelas raízes, entretanto, é restringida pela forma em que esses aminoácidos se encontram, pela atividade de microrganismos no solo e pelo próprio metabolismo das plantas (Schulten; Schnitzen, 1997; Jamtgard, 2010). Por exemplo, na forma de proteínas os aminoácidos podem ser pouco disponíveis às plantas quando em baixas concentrações, mas sua disponibilização pode ser mediada pela ação de enzimas proteolíticas exsudadas por micróbios de vida livre, fungos micorrízicos e raízes de plantas, além de fatores como pH do solo (Godlewski; Adamczyk, 2007; Paungfoo-Lonhienne et al., 2009). Entretanto, já se demonstrou que a utilização de aminoácidos pelas plantas é mais favorável energeticamente em relação ao NO3– e NH4+ (Jamtgard, 2010), e alguns autores ainda divergem sobre a taxa de absorção de aminoácidos pelas raízes podendo superar o nitrato (Peerson et al., 2006), por outros autores considerado como a forma de nitrogênio mais absorvida pelas plantas (Finzi; Berthrong, 2005).
A absorção pelas raízes é mediada pela presença de alguns transportadores presentes nelas, como o LHT1 (Lysine Histidine Transporter), AAP1 e AAP5 (Amino Acid Permease 1 e 5), onde cada um possui diferente especificidade e afinidade com os aminoácidos (Hirner et al., 2006; Lee et al., 2007). LHT1 e AAP1 estão relacionados a absorção dos aminoácidos neutros e ácidos, já AAP5 pela absorção de lisina e arginina (Hirner et al., 2006).
Efeitos da aplicação de aminoácidos nas plantas
Os aminoácidos desempenham diversos papéis essenciais no metabolismo primário e secundário das plantas, além de atuarem como fontes de nitrogênio. Eles também desempenham funções específicas como precursores para a síntese de metabólitos secundários, como é o caso de hormônios e moléculas de defesa (Buchanan et al., 2000).
Alguns trabalhos têm analisado os efeitos da aplicação de aminoácidos em culturas anuais e perenes. Furuya e Umemiya (2002) constataram maiores taxas de absorção de ureia e nitrato de sódio seguido pelos aminoácidos L-alanina, L-glutamato, L-glicina e L-lisina aos sete dias após a aplicação na cultura do pessegueiro (Prunus domestica).
Nagao et al. (2005) observaram que a aplicação de prolina e inosina aumentou significativamente a massa de matéria fresca de azevém (Lolium multiflorum).
Neeraja et al. (2005) verificaram que o uso de aminoácidos proporcionou o aumento no número de flores e no rendimento de frutos em plantas submetidas a condições salinas.
Os aminoácidos também se provaram importantes agentes para tornar as plantas mais tolerantes a doenças, promovendo melhor crescimento e nível nutricional dos espécimes analisados (El-Ghamry et al., 2009).
Os efeitos observados em todas essas pesquisas, entretanto, foram obtidos com a aplicação simultânea de vários aminoácidos, então não se poderia definir quais são os responsáveis diretos pelos ganhos. Em pesquisa realizada por Teixeira (2016) na ESALQ/USP, os aminoácidos foram aplicados separadamente e em conjunto (no tratamento de sementes, via foliar e em ambas) na cultura da soja.
Dentre os ganhos observados estão o aumento nos teores de formas de nitrogênio nas folhas, nos aminoácidos totais e nas enzimas associadas a nutrição das plantas, como a enzima urease, e enzimas antiestresse e de resistência.
O desenvolvimento das raízes também foi impactado positivamente com a aplicação de aminoácidos em todos os parâmetros analisados, como o comprimento da raiz principal, comprimento total de raízes, área superficial das raízes, número e comprimento das raízes laterais.
Como utilizar os aminoácidos na lavoura
Segundo as conclusões de Teixeira (2016), considerando que os resultados foram obtidos para a cultura da soja, pode-se concluir que as melhores práticas para a aplicação de aminoácidos em lavouras comerciais consistem na aplicação de aminoácidos tanto no tratamento de sementes quanto na pulverização foliar, mas com eficiência diferente para cada um dos aminoácidos:
- a aplicação de glutamato, cisteína, fenilalanina e glicina, de maneira individualizada, apresentou melhor efeito quando aplicada no tratamento de sementes;
- o tratamento completo provou-se mais eficiente quando aplicado via foliar
As doses obtidas dos aminoácidos no tratamento de sementes são: glutamato – 12 mg kg-1 (de semente); cisteína 12 mg kg-1 (de semente); fenilalanina 3 mg kg-1 (de semente), glicina 9 mg kg-1 (de semente).
Atualmente é possível observar diversos estudos que comprovam incrementos em alguns aspectos no metabolismo da planta, como: tolerância vegetal a estresses abióticos, efeitos positivos no controle de doenças e incrementos na produtividade. Ainda é necessário se aprofundar mais em estudos a respeito do uso de aminoácidos para entender melhor sua interação com as plantas, mas observa-se um grande potencial do seu uso nos sistemas agrícolas.
Conclusão
Os aminoácidos são moléculas orgânicas essenciais para o metabolismo das plantas, e sua aplicação nas lavouras comerciais é capaz de desencadear respostas fisiológicas que trazem benefícios ao crescimento e desenvolvimento das plantas, bem como as auxiliam no enfrentamento de doenças e ataques de pragas e também estresses abióticos.
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