C3, C4 e CAM: o que são essas plantas e como diferenciá-las

Muito se escuta sobre plantas C3, C4 e CAM, mas poucos sabem definir cada uma destas e destacar suas diferenças. Este artigo visa esclarecer como surgiram essas diferenças, o porquê elas existem e, por fim, como funcionam cada uma dessas vias fotossintéticas.

Para entendê-las é preciso, primeiramente, lembrar que plantas recobrem a superfície terrestre há, pelo menos, 360 milhões de anos1 e desde então estão sujeitas a alterações no ambiente que as induzem à evolução. No caso discutido aqui, plantas C4 e CAM adaptaram-se a climas mais quentes e secos dos que estão submetidas as plantas C3; quando expostas a temperaturas mais elevadas – que conduzem ao fechamento dos estômatos – as plantas C3 podem sofrer muito mais com um processo chamado fotorrespiração, uma via metabólica dispendiosa que ocorre quando a rubisco, enzima fixadora de carbono do Ciclo de Calvin, captura O2 no lugar de CO2. Essa situação conduz ao consumo do carbono que foi fixado pela fotossíntese e ao desperdício de energia, ou seja, é um quadro indesejável quando o objetivo é a obtenção da máxima produtividade vegetal.

As plantas C4 e CAM, por sua vez, desenvolveram alternativas metabólicas em seus organismos que evitam a fotorrespiração, ainda que sob as mesmas condições que sujeitam as plantas C3 a sofrerem com esse processo. Essas alternativas serão demonstradas a seguir.

Índice

Fotorrespiração

Para poder diferenciar os mecanismos de plantas C3, C4 e CAM é preciso, antes de tudo, compreender bem o fenômeno que conduziu à diferenciação desses organismos.

A fotorrespiração é um processo que ocorre naturalmente pela ação “falha” da enzima mais abundante do planeta, a rubisco, enzima essencial para a fotossíntese. Na rota fotossintética normal, presente nas plantas C3, ocorre a carboxilação quando a rubisco adiciona dióxido de carbono (CO2) a um composto com 5 carbonos chamado de ribulose-1,5-bifosfato (RuBP) e o produto de sua reação são duas moléculas de um intermediário de três carbonos chamado 3-fosfoglicerato (3-PGA), por isso o nome C3.

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Figura 1 – Ciclo de Calvin-Benson
Fonte: Taiz e Zeiger, 2017

Contudo, o “defeito” da rubisco é que ela pode utilizar o oxigênio (O2) no lugar do CO2, causando a oxigenação da ribulose-1,5-bifosfato ao invés de sua carboxilação, dando origem a uma molécula de 3-PGA e uma de 2-fosfoglicolato. Contudo, o 2-fosfoglicolato induz ao consumo do carbono fixado e inibe duas enzimas do cloroplasto: triose fosfato isomerase e fosfofrutoquinase. Para evitar esses processos que afetam a produção eficiente de energia pela planta, o 2-fosfoglicolato é metabolizado pela fotorrespiração para que retorne ao Ciclo de Calvin-Benson como 3-fosfoglicerato; esse processo não é gratuito e consome energia e libera CO2.

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Figura 2 – Ciclo Oxidativo C2
Fonte: Taiz e Zeiger, 2017

O que determina se a rubisco irá conduzir o CO2 ou o O2 para o Ciclo de Calvin são dois fatores: a proporção das concentrações dos dois gases e a temperatura. Em situações de temperatura elevada e/ou baixa umidade, quando as plantas fecham os estômatos para reduzir a perda de água, o O2 produzido pela fotossíntese se acumula no interior da folha enquanto a entrada de CO2 da atmosfera é impedida, aumentando a proporção de O2 em relação CO2.2 Ademais, quando a temperatura se eleva, a afinidade da rubisco pelo CO2, que em condições mais amenas chega a ser 80 vezes maior do que pelo O2, é reduzida.3

Plantas C3

As plantas C3 são chamadas assim, como comentado anteriormente, porque o primeiro produto orgânico da fixação do carbono é um composto com três carbonos, o 3-PGA. Esta categoria representa 85% de todas as plantas do planeta e dentre elas temos o arroz, a soja, o feijão, o trigo e todas as árvores.

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Figura 3 – Via fotossintética C3
Fonte: Adaptado de Khan Academy

Plantas C4

A maneira que as plantas C4 encontraram para reduzir a fotorrespiração foi separar fisicamente onde a fase clara/fotoquímica da fotossíntese e o Ciclo de Calvin ocorrem em seu organismo. A primeira etapa (fase clara) ocorre nas células do mesófilo esponjoso, enquanto o Ciclo de Calvin é realizado dentro das células da bainha do feixe vascular – células que circundam os feixes vasculares (nervuras) das folhas.

Nas células do mesófilo, o CO2 é fixado e transformado em ácidos orgânicos de 4 carbonos, dando nome às plantas que utilizam essa via fotossintética; pelo menos 19 famílias de plantas possuem esse metabolismo e as dentre as mais importantes para a agricultura podemos citar a cana-de-açúcar e o milho, ambas membros da família das gramíneas (Poaceae). 

Em um primeiro momento a enzima PEP-carboxilase, de presença exclusiva às células do mesófilo, adiciona o CO2 ao fosfoenolpiruvato (PEP) e forma o oxalacetato (o produto de quatro carbonos mencionado anteriormente). Diferentemente da rubisco, a PEP-carboxilase possui uma maior afinidade com o CO2 e nenhuma com o O2, ou seja, mesmo em condições onde os estômatos estão parcialmente fechados e a concentração de CO2 é reduzida, a PEP-carboxilase continua fixando carbono.

Depois de fixado o carbono em oxaloacetato, ele é transformado em malato e transportado pelos plasmodesmos para as células da bainha do feixe vascular e, só então, é quebrado, liberando CO2. A partir deste momento, a rubisco retoma o seu papel normal e incorpora o CO2 ao Ciclo de Calvin para posterior produção de açúcares. Com essa divisão física e o constante bombeamento de CO2, a região ao redor da rubisco está sempre saturada por CO2 em relação ao O2, evitando a fotorrespiração.

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Figura 4 – Via fotossintética C4
Fonte: Adaptado de Khan Academy

Mas o benefício obtido pela separação física das fases da fotossíntese não é gratuita; o retorno do piruvato para a célula do mesófilo e a transformação em PEP-carboxilase exige ATP. Como as plantas C4 são comuns em condições quentes, os benefícios com a prevenção da fotorrespiração são maiores do que os prejúizos com esse gasto energético.4

Plantas CAM

Outras plantas que se adaptaram a climas mais áridos ainda, como cactos e abacaxis, também desenvolveram outros mecanismos para evitar a fotorrespiração, um deles e a via do metabolismo ácido das crassuláceas (CAM). Seu nome tem origem da família de plantas em que ocorre, as Craculaceae.

No lugar da separação física das fases da fotossíntese, essas plantas recorreram a uma separação temporal. Ao invés de abrirem seus estômatos durante o dia, essas plantas os abrem durante a noite. Dessa forma, com a abertura dos estômatos ocorre a difusão do CO2 para a parte interna das folhas e, assim como nas plantas C4, é fixado em oxaloacetato pela PEP-carboxilase e depois transformado em malato e outros ácidos orgânicos que são armazenados em vacúolos.

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Figura 5 – Via fotossintética CAM
Fonte: Adaptado de Khan Academy

Durante o dia, elas utilizam essa reserva de ácidos orgânicos como fonte de CO2 para abastecimento do Ciclo de Calvin, dessa forma mantenda a saturação por CO2 ao redor da rubisco. Esse mecanismo também auxilia na redução da perda de água, tão importante para essas espécies.4

Contudo, assim como nas plantas C4, essa via metabólica não é gratuita e o transporte e armazenamento desses ácidos orgânicos consomem energia em ATP.

1Institucional - C3, C4 e CAM: o que são essas plantas e como diferenciá-las

Conclusão

Em suma, todas essas adaptações são mecanismos desenvolvidos pelas plantas ao longo de milhões de anos para melhor se adaptarem ao ambiente em que se encontram. A interpretação e o entendimento dessas vias metabólicas é de suma importância para o planejamento agrícola e práticas de manejo tais como irrigação e espaçamento.

“A produtividade da lavoura é proporcional ao conhecimento aplicado por hectare, por planta em todo o metro quadro. O conhecimento resulta em produtividade por hectare e rentabilidade para a lavoura”. – Dirceu Gassen.

Referências bibliográficas

KENRICK, Paul; CRANE, Peter R.. The origin and early evolution of plants on land. Nature, [S.L.], v. 389, n. 6646, p. 33-39, set. 1997. Springer Science and Business Media LLC. http://dx.doi.org/10.1038/37918.

TAIZ, Lincoln et al. Fotossíntese: Reações de Carboxilação. In: TAIZ, Lincoln; ZEIGER, Eduardo. Fisiologia e Desenvolvimento Vegetal. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2017. Cap. 8. p. 203-243.

BERG, Jeremy M.; TYMOCZKO, John L.; STRYER, Lubert. The Calvin cycle synthesizes hexoses from carbon dioxide and water. In: BERG, Jeremy M.; TYMOCZKO, John L.; STRYER, Lubert. Biochemistry. 5. ed. Nova Iorque: W. H. Freeman, 2002. Cap. 20.1. p. 828-839.

REECE, Jane B. et al. Fotossíntese: mecanismos alternativos de fixação do carbono evoluíram em climas áridos e quentes. In: REECE, Jane B. et alBiologia de Campbell. 10. ed. Porto Alegre: Artmed, 2015. p. 200-204.

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